Donnerstag, Juni 29, 2006

metabloguismo (e o "pathos" do fragmento) II

0.98

Não é a primeira vez que cito aqui João Barrento (aliás, também nessa altura com implicações neste assunto), e não me é difícil fazê-lo já que é das poucas penas que ainda vale a pena ler na imprensa portuguesa (e não só, evidentemente).
Escrevia ele a 29 de Abril no seu Escrito a Lápis (Público/Mil Folhas): "Parece haver em toda a modernidade (que, nisto, se prolonga sem cesuras pela pós-modernidade), um fascínio particular, e explicável, pela expressão fragmentária." E, no parágrafo seguinte apercebia-se "ainda melhor de como o fragmento é intrinsecamente moderno (ou, talvez melhor, a modernidade intrinsecamente fragmentária[...]".

Isto a propósito do pathos fragmentário da escrita blogosférica. E pathos, justamente, porque de paixão se trata, afecção, encontro colossal, intensidade expressiva: "Enquanto o aforismo é uma forma que radica na convicção, o fragmento romântico (como hoje, os "pequenos tratados" de Pascal Quignard) é fruto da paixão". De facto, neste texto, Barrento tratava de uma figura absolutamente singular neste contexto - Novalis - e como, o seu esculpir desta forma estética marcava os alvores da modernidade. Ora, em Novalis, os fragmentos são carregados de uma qualidade seminal (o volume que Barrento preparou intitula-se, apropriadamente "Fragmentos são Sementes") donde brota aquilo que silenciosamente se transporta.

No entanto, no primeiro Romantismo alemão em geral, e em Novalis em particular, o fragmento ainda se reporta a uma "totalidade" por um mecanismo dialéctico, pretendendo "ser a expressão da irrepresentabilidade do todo, mas ao mesmo tempo da sua possibilidade de apreensão indirecta". Era a crença na "força sintética da unidade absoluta" da geração de Iena, que o Idealismo vai converter numa "vontade de sistema".

Contudo, não é, pois, necessário ter lido a Athenaeum, para perceber que é impensável, hoje, compreender a operatoriedade e poética do fragmento a partir desta mundividência. Aliás, o fragmento potencia-se a si mesmo, e sobrevive (na blogosfera ou noutro lado qualquer), na justa medida em que escapa a este binarismo primário das letras clássicas (mesmo se, no seu surgimento fosse a mais audaz revolução literária), e adquire uma posição exterior, em que prima por ser, antes de tudo, uma expressão da singularidade (nem universal, nem particular; nem genérica, nem específica). Sem mais. Nem menos.